quarta-feira, 15 de novembro de 2017

O ESPANTALHO



ADAPTAÇÃO PARA TEATRO
AUTOR: JOÃO EVANGELISTA DE SÁ

PERSONAGENS:
PAI: GENARO
MÃE: TIANA
FILHO: TENORO
PESCADORES: TINOCO E CARLÃO
FIGURANTES: VÁRIAS PESSOAS RELIGIOSAS
NARRADOR: A CRITÉRIO DA DIREÇÃO

NARRADOR:

O folclore brasileiro é riquíssimo, porquanto esta é uma oportunidade de aqui demonstrar durante a apresentação o que a imaginação humana é capaz de fantasiar, desta forma, iremos apreciar um trecho de nossa literatura que retrata a beleza dos contos e causos folclóricos, aproveitamos para esclarecer que os personagens são de criações fictícias e se por acaso houver alguma coincidência com a realidade, pedimos as nossa desculpas, pois será puro e mero acontecimento, apenas o lugar em que situa o palco da nossa apresentação é de conhecimento regional, podendo aqui adiantar que tudo aconteceu no Rancho, lá no Ribeirão da Mesa.

MÃE, PAI E FILHO ESTÃO JUNTOS PREPARANDO PARA A LIDA NO ROÇADO.


FILHO: Mãe! Hoje tá frio. Tá caindo geada.
MÃE: Tá, Tenoro. Mas é só agora de manhãzinha. (VIRA PARA O PAI) Num é mesmo Genaro?
PAI: É Tiana, mas agora vamos. O roçado nos espera.

SAEM OS TRÊS ELA COM UMA BIA DE ÁGUA NA CABEÇA E ELES COM AS ENXADAS NAS COSTAS

NARRADOR: Lá chegando, antes de começar a capina, para surpresa de todos quase toda a plantação havia sido destruída.

FILHO: Nossa! Danou tudo. Cadê a plantação, mãe?
MÃE: Mas o que poderá ter destruído nossa roça Tenoro? Meu Deus! E agora?
PAI: Num se lembra muié? O ano passado foi à mesma coisa. Tivemo qui plantá tudinho de novo. Isto é arrumação do arranca mio. Aquês passarinho preto. A gente planta e eles vem atrás cantando. Sê finca, iue ranço... Sê finca, ieu ranço... Ai. Dá nisso.
FILHO: Se ieu incontrasse eles aqui... Sei não... Matava um pur um, ah! ieu matava...
PAI: A gente num pode matá os bicho não fio. Os bicho é da natureza. Se a gente matá vem um tal de IBAMA e acaba prendendo nóis tudo.
MÃE: Antonce o que vamo fazê cum esses danado? Se num pode matá, o que vamos fazê cum eles Genaro?
FILHO: Tive uma idéia...
PAI: Idéia? Mas qui idéia é essa fio?
FILHO: Quando a gente chega lá na roça, os arranca mio num voa? Pois intão? Isto qué dizê qui eles tem medo de nóis, num é mermo mãe?
MÃE: E É...
FILHO: Antonce vamo prá casa. Lá chegando a gente faz um buneco de páia e batiza ele de Mané, igualzinho nosso vizinho, adispois finca ele lá no meio do roçado. Os danado num vai arranca mais nem um pé de plantação. Ah! Num vai.
MÃE: Isto num vai dá certo. Chamá o buneco de Mané. Isto num vai dá certo. Nosso vizinho vai acabá brigando.
FILHO: Antonce, mãe, vamo batizá ele de Mané Tibiriçá.
PAI: Ah! Mané Tibiriçá... Mané Tibiriçá pode. O Mané nosso vizinho é cunhecido cumo Mané do Torra Dora. Antonce ele num vai brigá num é mermo Tiana?
MÃE: É. Antonce vamo logo dá um jeito no Mané Tibiriçá. Vamos!

SAEM OS TRÊS

NARRADOR:
A Construção do Mané Tibiriçá, o espantalho, não demorou muito tempo. Assim que acabada a obra, colocaram chapéu, braços e pernas, o que tornou o Mané Tibiriçá, a imagem de um homem, então eles voltaram para fincar aquela arte lá no meio do roçado que já havia sido replantado e vinha estourando a terra mostrando as primeiras folhas.
Tenoro, o filho daquele casal, passou a estimar o Mané Tibiriçá como se o mesmo fosse um ente da família.
Tudo para Tenoro era o tal do espantalho, mas o pior aconteceu. Um temporal com chuva e ventos fortes. É isso mesmo. Aconteceu no Rancho, lá no Ribeirão da Mesa. Veio chuva de granizo, depois vento, depois chuva com fortes enxurradas causando enorme destruição e tudo para desespero daquela família. Levou tudo. Tudinho. Inclusive o Mané Tibiriçá.

PAI, MÃE E FILHO.

PAI: A chuva foi muita. Caiu pedra. A ventania quase que dirruba os pés de jenipapo. Vai vê, a roça foi toda. Será que o Mané Tibiriçá tá lá fincado Tiana?
MÃE: Ele foi bem fincado, antonce acredito que só ele restou pur lá Genaro.
FILHO: E se a chuva levou o Mané? E se ela levou ele?
PAI: A gente sai prucurando ele até achá. A roça, a gente pranta outra, Mas o Mané...

NARRADOR: Lá chegando não havia nem um pé de plantação pra remédio. Tudo tinha sido levdo pelo vento e as águas da forte chuva que havia caído. Foi mesmo um espanto para todos.

MÃE: Nossa! Virge! A chuva levou tudo. Levou o Mané tombém.
FILHO: Ieu quero o Mané! (GRITANDO) Ieu quero o Mané!
PAI: E agora Tiana? E agora? E melhor a gente vortá pru rancho e saí bem cedo amanhã para procurá o Mané pelas vizinhança.
FILHO: Ieu quero o Mané! (GRITANDO) Ieu quero o Mané!
PAI: Carma fio... Carma a gente vai incontrá o Mané.
MÃE: Antonce Vamos! Amanhã cedo vamos incontrá ele se Deus quizé.
FILHO: Ieu quero o Mané! (GRITANDO) Ieu quero o Mané!
NARRADOR: Os três voltaram e no dia seguinte, quando acordaram uma tragédia havia acontecido àquela família, o filho do casal ficou traumatizado com a perda do espantalho.

MÃE: (GRITANDO) Genaro! Ô Genaro! Venha até aqui home.
PAI: (ENTRA CORRENDO) O que foi Tiana? O que foi?
MÃE: É Tenoro, nosso fio... Ele tá mudo... Num qué acordá.
PAI: (SACUDINDO O FILHO) Acorda Tenoro. Acorda fio.
FILHO: (APENAS ACORDA E LEVANTA, MAS NÃO DIZ NADA, APENAS ACENA)
MÃE: Nosso filho ficou mudo. Meus Deus! Nosso filho está mudo, Genaro.
PAI: Carma Tiana, vamo leva ele no doutor e rezá pedindo a Deus. Vai dar certo. Vamos!

NARRADOR: Os três saíram em busca de ajuda. Foram até à cidade fazer consulta médica, porém nada pode ser feito. O trauma havia bloqueado a voz daquela criança. Só mesmo um milagre poderia devolver a ele aquele sentido. Os dias foram passando e nada de melhora, mas enquanto isso, lá no Córrego do São Nicolau Grande, dois pescadores lançavam os anzóis na água corrente na esperança de encontrar peixes grandes, mas a pesca naquela região estava escassa e para surpresa dos dois algo estranho foi fisgado por um deles, foi mais ou menos assim:

CARLÃO: Aqui ta rui de peixe, Tinoco.
TINOCO: Vou muda pru poço de baixo, quem sabe...
CARLÃO: Corre aqui Tinoco. Parece que fisguei um e é dos grandes.
TINOCO: Nossa! Virge! Esse é dos bão. Vai vê é Piau.
CARLÃO: (ARRANCA O ESPANTALHO E SAI GRITANDO) Isto é um santo! É milagre! Um santo.
TINOCO: E agora? O que devemos faze Carlão?
CARLÃO: Lá num tem aquela capela? A gente põe o santinho lá e vamos dize pra todos que ele é milagreiro.
TINOCO. Isso mesmo! Vamos!

(SAEM OS DOIS LEVANDO O ESPANTALHO)

NARRADOR
Os dois então foram e colocaram o espantalho no altar da capela e anunciaram que aquele santo milagreiro estava curando as pessoas daquela região, não demorou muito tempo uma grande romaria estava sendo realizada em busca da salvação. A notícia espalhou por todos os cantos e foi cair nos ouvidos de Genaro e Tiana que imediatamente resolveram levar o filho Tenoro que havia sofrido um trauma por ter perdido o espantalho e acabara ficando mudo. Então rumaram para lá.

PAI: Olha, Tiana, ouvi dize que tem um Santo milagreiro lá no Córrego do São Nicolau Grande.
MÃE: Ah! É? Antonce vamo levar o Tenoro lá, quem sabe ele volta a fala.
PAI: Isso mesmo. Vamos.

SAEM OS TRÊS

NARRADOR:  Enquanto isso, lá na capela do Córrego São Nicolau Grande o povo se reunia e grande número para fazer os pedidos ao santo, o Espantalho.

ENTRAM VÁRIAS PESSOAS E SE AJOELHAM DIANTE DO ESPANTALHO, NESTE MOMENTO ENTRA O PAI, A MAE E O FILHO

FILHO: (ENTRANDO VÊ O ESPANTALHO E SOLTA UM GRITO) Pai! Aquele é o Mane, É o Mane Tibiriçá.

PAI: Olha! O meu filho está falando! Milagre! Milagre! Milagre
MÃE: Ele é mesmo um santinho. O meu filho está falando. Milagre!

TODOS
(SAINDO E CARREGANDO O ESPANTALHO VÃO GRITANDO À UMA SÓ VOZ)

Milagre! Milagre! Milagre!

FINAL

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